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Quando a criança emudece os adversários

II Reis 5:1-15 

Este fantástico texto da Bíblia narra a cura do general sírio Naamã não poderia ser mais propício para o dia de hoje. Pode ser que haja textos de igual importância, porém, mais importantes, eu duvido. Ele narra, simplesmente o modo de agir de cada pessoa diante dos escândalos que vêm se repetindo ao longo dos séculos. Expõe com clareza aquilo que cada personagem realizou, e o faz como um prenúncio do que não deveria acontecer, mas continua acontecendo. 

O rei da Síria, por exemplo, vencedor da batalha e dominador de Israel. Aquele que representa o poder supremo. Sua atuação não tem nada de extraordinário. Ele fez o que qualquer rei opressor faria, exigiria a obediência sem questionamentos dos povos conquistados. 

O segundo personagem é rei de Israel, vassalo da Síria, que também faz exatamente o que podia se esperar de um subalterno medroso e sem fé e sem perspectivas. Dá um tremendo chilique ao ler a tal ordem que o rei da Síria o enviara. Temos que admitir que realmente que rei sírio pede absurdo, mas admitir também, que é bastante comum que perdedor reclame de qualquer exigência que seja condicionada à sua derrota. Quando alguém perde alguma coisa importante, como a liberdade, começa a pensar que aquilo é tudo de ruim que poderia ter acontecido e que nada mais poderá piorar a sua situação. É justamente na hora que sobrevém as consequências da perda. Ele rasga a roupa, blasfema, enfim, que coloca para fora toda a sua indignação pela circunstância. É justamente nessa hora que a pessoa joga toda a responsabilidade do infortúnio em cima  da igreja e da religião, como bem soube fazer esse rei. 

Falemos um pouco do leproso, que estava ansioso pela possibilidade de cura. Sua esperança se mostrava tamanha que antecipadamente estipulou um valor como pagamento para que esta se realizasse. Vamos pensar naqueles indivíduos que são movidos pela onda do toma lá da cá. Esse é Naamã, que não chega à tenda do profeta com a humildade de quem necessita de um favor inusitado, mas com toda a pompa que a sua posição de general do maior exército do mundo de então exigia. Com a soberba de alguém que tem influência sobre alguém que tem um poder que ele não possui, mas que obstinadamente necessita. A ordem do profeta para que se lave sete vezes no rio Jordão é o banho de lama em todo seu orgulho. Toda a sua antevisão da cura seria um espetáculo pirotécnico. Diz: Eu pensei que ele viria a mim, invocaria seu Deus para que estivesse presente, fizesse cair fogo do céu sobre mim, e aí sim, eu ficaria curado. Mas o profeta lhe diz, ou melhor, manda dizer: Vai tomar banho. Vá tirar esse casca de soberba, de autoridade, de superioridade. Aqui em Israel ela não vale nada. 

Esta é a imagem mais bem fotografada de alguém que chega necessitando e carente de algo que por meios naturais não pode conseguir. Esta é a única razão dos mercadores da fé se procriarem com a abundância que se vê hoje em dia, porque eles seguem justamente esse ritual mirabolante. Por mais absurda que seja a ideia, ela vai encontrar um seguidor fiel. Outra coisa que a expectativa da cura faz é não atentar para os detalhes que julga ser ínfimos e sem import. Entrar e sair sete vezes do rio Jordão não era nada extraordinário, a população local fazia isso todos os dias e nada acontecia. Além do mais, os rios da Síria são realmente rios, não como esse córrego sazonal que corta Israel. Por conta disso, a pessoa também acredita que Deus precisa usar o que há de melhor a seu alcance para obter alguns bons resultados. É isso que sempre motivou oferendas e sacrifícios, a ideia de que a divindade se deixa corromper pela qualidade da oferta. Não o Deus de Israel: misericórdia quero, e não sacrifício. 

Mas não podemos nos esquecer do profeta. Elizeu sequer saiu de sua tenda da receber a comitiva enviada pelo poderoso rei da Síria. É assim que todo profeta de Deus deveria agir, de forma alguma se curvar diante de um poder político e de forma alguma coloca-lo acima do lugar que lhe é devido. Mesmo sabendo que o general vitorioso chegara com status de chefe de estado, sequer sai da sua tenda para recebe-lo, mas ordena que alguém o faça: manda esse cara tomar banho. Não estou bem certo que ele tenha dito exatamente isso, mas os profetas de Israel eram bem desaforados, não mostravam qualquer escrúpulo nem conveniência quando o assunto afrontava a Palavra de Deus, da qual era portador.  Amós chamava as mulheres dos governantes de vacas, Ezequiel dizia que elas se deitavam com jumentos. Por isso acho que Eliseu foi até muito brando para causar tanta indignação a Naamã. Mas no final da contas Eliseu fez tão somente o que se podia esperar de um profeta. 

Talvez o sensato de toda a história seja o servo de Naamã. Homem ponderado, de medidas cautelosas, alguém que realmente sabe da sua necessidade. Ele é a palavra conciliatória, um oásis de sensatez nesse deserto de absurdos. Se Eliseu tivesse lhe pedido algo impossível, como o senhor faria? Ele pediu uma coisa tão simples, por que não fazer? É bem provável que ele já tivesse presenciado inúmeros outros rituais ridículos e tentativas frustradas de cura. Quando se viu diante da simplicidade da ação de um Deus de verdade, não teve dúvidas, não teve como não se render às evidências. 

Temos também o ajudante de ordem de Eliseu, mas este não merece sequer um comentário, em virtude da sórdida atitude que teve a seguir. 

Todos agiram conforme o esperado. Todos representaram bem os seus papéis de coadjuvantes. Ninguém se portou fora da curva. Ninguém fez a diferença ou algo impensado. Alguém, dentre estes citados, superou qualquer expectativa que se pudesse conceber? Todos não. Uma certa menina hebraica, que mal passava de uma adolescente; que foi levada cativa, provavelmente acorrentada, em uma jornada exaustiva, para um país longínquo e de língua estranha. Uma menina, que foi arrancada à força da sua família, dos seus amiguinhos, dos seus brinquedos e distante das coisas que aprendera a amar. Logo ela, tão frágil, e tão machucada, foi a única porta voz de Deus a fazer toda  diferença nesta narrativa. Apesar da sua dor, mesmo sem entender o porquê não guardou ódio do carrasco no seu coração, pelo contrário, amou aquele que tanto lhe fez mal. Ela foi como o sândalo que perfuma o machado que o fere. Ela antecipa um dos mandamentos primordiais da fé cristã: amar o inimigo e querer o bem dos que nos fazem mal. Ela é mais bem aventurada, porque não viu e creu. No seu pequeno e ferido coração ela guardou sem medida uma fé inabalável no seu Deus. 

No Brasil de hoje a história se repetiu. Enquanto esperávamos dos mais variados segmentos da sociedade alguma providência em socorro aos que não têm voz. Enquanto nos digladiávamos por questões ideológicas. Enquanto discutíamos filosoficamente o certo e o errado, uma menina de voz trêmula foi o arauto mais definitivo de Deus ao denunciar aquilo que todos os personagens teriam que fazer na Ilha de Marajó, e não fizeram. 

Ambas as meninas deram sentido a toda história. Elas fizeram a perfeita leitura da situação. Assim como Paulo, foram elas quem nos ensinaram a crer, que mesmo em meio à angústia, todas as coisas concorrem para o bem dos que amam a Deus, porque para Deus pouco importa o tamanho ou o cargo da pessoa. Importa sim o tamanho da sua fé. Elas nos ensinaram que não importa o tamanho do nosso problema. Importa sim o tamanho do nosso Deus.

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